Nas minhas palestras e reuniões com diversas empresas venho observando que Cloud Computing já começa a se posicionar no radar dos executivos e fazer parte de seus planos de médio e longo prazo. E uma das questões que estão em busca de resposta é “por onde começar?”. Que tipo de aplicações colocar inicialmente nas nuvens?
Bem, muitos estão pensando em começar por “client in the cloud”. É um cenário que já é comum no ambiente de usuários finais, que já usam regularmente Yahoo!Mail, Gmail, Google Docs, Facebook, Flickr e outros serviços disponíveis em nuvem. Armazenar caixas postais, textos, fotos e vídeos em nuvem e acessá-los por qualquer dispositivo, sem estar preso aos discos internos de um único computador é um atrativo que atrai mais e mais usuários finais.
Me parece claro que este cenário pode e provavelmente será disseminado também no ambiente corporativo.
Vantagens? Acessar seus dados de qualquer dispositivo, seja de um veterano desktop a um smartphone ou tablet, pouca ou nenhuma demanda por desgastantes e pouco produtivos trabalhos de implementar e atualizar diversas versões de softwares, que vão de sistemas operacionais a suites de escritório em centenas ou milhares de máquinas, obter uma gestão centralizada dos aplicativos que rodam nos dispositivos cliente e, além de tudo, saber que se um laptop for perdido ou roubado, os dados estarão a salvo, pois não estão armazenados nele, são pontos extremamente positivos que despertam muito interesse.
O ponto de partida para se pensar em “client in the cloud” é o onipresente email. Uma das principais razões para se pensar em email na nuvem são as significativas economias de escala que se consegue com este modelo computacional. A maioria das empresas não tem mais que centenas ou milhares de usuários, enquanto um provedor de nuvem pode fornecer estes serviços para dezenas de milhões de usuários. Assim, com data centers com “lights-out operations” e imensa capacidade de processamento e armazenamento conseguem ofertar serviços de email a preços muito baixos, chegando no limite a zero! O resultado é que quando se compara o custo por usuário, o modelo em nuvem oferece custos muito menores. Além disso, devido às restrições orçamentárias e a economia de escala, o email interno não pode disponibilizar grandes capacidades de armazenamento. É comum compararmos um email interno restrito a 300 ou 500 MB por usuário com um email na nuvem com 25 ou 30 GB. O custo por GB na nuvem é imensamente menor pela economia de escala e portanto o provedor pode oferecer, a um custo mínimo, muito mais capacidade de armazenamento.
O custo de serviços de “client in the cloud” tende a baixar ainda mais, principalmente porque existe um disrupção no modelo de negócios da indústria de software tradicional que é o efeito Google. Para o Google, suas ofertas GAPE (Google Apps Premier Edition) não visam lucro, mas sim substanciar seu modelo de negócio baseado em receitas oriundas de advertising. É uma ação estratégica e não uma orientada à lucratividade. Se compararmos com as empresas típicas do modelo tradicional “client in the PC”, como a Microsoft, vemos que nestas sua receita vem da venda de licenças de seus softwares. Mesmo ofertando estes serviços no modelo em nuvem, sua fonte de receita será o serviço oferecido pelo software e não advertising e portanto não podem se dar ao luxo de chegar a preço muito baixo. É o modelo Freemium por excelencia. Sugiro lerem o livro do Chris Anderson, “Grátis” editor da revista Wired e autor do livro “A Cauda Longa”. A tese principal do livro é que o modelo “freemium” – no qual se dá a maior quantidade de um certo produto de graça, mas se cobra pela versão premium daqueles consumidores dispostos a pagar por uma versão mais sofisticada – é um dos modelos de negócio mais quentes atualmente.
Isso se torna ainda mais real quando temos bens com um custo marginal de quase zero, como os bens digitais (músicas, filmes, conteúdo). Esses bens são oferecidos gratuitamente com a intenção de se alcançar algum outro beneficio. O que o Google faz? Oferece o GAPE em troca da expansão de um novo modelo (nuvem) onde se posiciona favoravelmente no mercado, pois este modelo impulsiona seu modelo de negócios. Com esta assimetria no cenário de negócios, fica dificil competir com o modelo tradicional.
Mas, se o email está indo para a nuvem, como isto se dará? De um dia para o outro? Na minha opinião a evolução será gradual. Os pioneiros serão as empresas de menor porte. A razão é simples: tem custo por usuário maior pela ausência de economia de escala, e portanto o atrativo econômico de irem para a nuvem também é maior. Além disso geralmente demandam menor necessidade de customização. O modelo multitenancy do email na nuvem torna a customização mais difícil e é um complicador para empresas maiores, que além de terem um custo por usuário menor (maior escala) são mais demandantes de ambientes altamente customizados. As empresas maiores serão, salvo exceções, late adopters deste modelo.
Surge um questionamento. Será um modelo tudo ou nada, ou seja, 100% dos emails estarão nas nuvens? Eventualmente em um futuro longinguo pode ser, mas pelo menos no horizonte previsível não. Teremos desde empresas 100% com email nas nuvens, outras onde será mais vantajoso economicamente manter seus servidores de email internamente, e outras com o modelo híbrido, com parte de seu email na nuvem e parte onpremise. Um exemplo? Uma universidade pode colocar as caixas postais de seus milhares de alunos em uma nuvem e manter internamente o email de seus professores e staff administrativo.
Mas, como proceder? Definir uma estratégia de colocar o email na nuvem não pode ser feita de forma superficial. Existem alguns cuidados a serem observados. Um deles são os custos ocultos. Embora o email na nuvem tenha um preço por usuário muito menor, existem alguns custos que não aparecem de imediato. Exemplos? Maior uso de redes e banda larga, migração do ambiente interno para a nuvem, e não esquecer que ainda será necessario manter um staff mínimo de suporte, menor que no ambiente interno tradicional, mais mesmo assim, ainda necessário, principalmente Help Desk de nivel 1 e para gestão do interface com o provedor da nuvem.
O contrato deve ser bem analisado e alguns itens devem merecer atenção redobrada como custo para retenção longa de backup (archiving) e cancelamento do contrato (e migração para outra nuvem). Existe também a questão legal. Suas caixas postais podem ficar armazenadas em um data center localizado em outro país? Neste caso, sob qual jurisdição as questões legais serão resolvidas? E caso haja uma investigação forense, como os dados poderão ser disponibilizados?
Quando uma informação é armazenada em uma nuvem, em última instância será armazenada em um servidor e um dispositivo de armazenamento residente em algum local físico, que pode ser em outro país, sujeito à legislações diferentes. Além disso, por razões técnicas esta informação poderá migrar de um servidor para outro servidor, ambos em países diferentes. Nada impede que a lei de um destes países permita o acesso à estas informações armazenadas, mesmo sem consentimento de seu “dono”. Por exemplo, a legislação antiterrorista ou de combate à pedofilía em diversos paises permite o acesso a informações pessoais, sem aviso prévio, em caso de evidências legais de atos criminosos. A questão é que o conceito de computação em nuvem é recente e a legislação em vigor ainda mal entendeu a Internet e está muito mais distante de entender a computação em nuvem. Ainda está no paradigma da época em que os PCs viviam isolados e no máximo se trocava disquetes. Apreender um desktop para investigação forense, cujo conteúdo estará nas nuvens será totalmente irrelevante. E como obter as informações de discos rígidos virtuais, espalhados por diversos provedores de nuvens?
Um outro cuidado a mais: segurança e integração com aplicações que interajam com seu email. Enfim, entrar no mundo do email na computação em nuvem não deve ser feita de forma atropelada. Crie um projeto específico, determine claramente os objetivos (reduzir custos?), identifique seus custos internos por usuário e compare com os provedores, analise as diferenças de funcionalidade existentes entre os recursos oferecidos pelo email interno e os oferecidos pelos provedores de nuvem (como nível de disponibilidade), engaje o jurídico no processo, selecione o provedor mais adequado e estude atentamente o contrato. E boa sorte!